Sobre a felicidade.

“Reconheci a felicidade pelo barulho que fez ao sair”, escreveu Jacques Prévet. Era desta frase que eu andava à procura, embora nunca a tivesse lido antes. Talvez já fosse suficientemente feliz e não soubesse. Mas, por tristeza ou ganância, queria aumentá-la. Às vezes, a infelicidade é tanta, que acreditamos estar apenas à mercê da boa fortuna, o primeiro significado que a palavra felicidade teve. É preciso alguma sorte, disse Aristóteles, mas também conhecimento. O filósofo proclamava que a felicidade não desaparece facilmente porque a pessoa experiente deixa de estar sujeita aos reveses da fortuna. “Entre decidir ser feliz e poder dizer que o é, terá de ter vivido muito”. Deve ser por isso que se fala da fatalidade da criança mimada, a quem lhe foi dado tudo para ser feliz, mas como a felicidade não pode ser dada, não a possui. Tem de ser conquistada, procurada, encontrada. Já dizia Nietzsche que “cabe ao indivíduo descobrir os segredos dessa plenitude que nos engrandece”, ainda que afirmasse que todos os conselhos acerca da felicidade eram inúteis, porque não se poderia ensiná-la. Leibnz também defendeu a ideia de que o sofrimento pode ser um instrumento em benefício da felicidade e da alegria. Para usufruir da própria felicidade, é preciso ter conhecido a infelicidade.

E, antes que fiquem cansados do name dropping, deixo-vos mais dois ou três pensamentos. Os Epicuristas diziam que a felicidade não se alcança com a procura frenética do prazer. Para ilustrar a ideia, o filósofo alemão Robert Spaemann imaginou a seguinte experiência: colocamos um homem sobre uma mesa e, depois de estar a dormir, injetamos uma substância química no cérebro dele, em doses regulares, para lhe proporcionar um sentimento de êxtase permanente. Depois de várias décadas, quando o corpo estiver muito velho, é sacrificado. Quem quer experimentar? Ninguém! Todos sabemos que a felicidade não se confunde com o estado de prazer contínuo.

Também há quem diga que a felicidade é atingida por um paradoxo: escapa a quem a procura. Se tivermos em conta a lógica, percebemos que não pode ser obtida. Para Schopenhauer, o mecanismo do desejo contraria a ideia da obtenção da felicidade. A satisfação de um desejo não produz a felicidade, mas um novo desejo. Daqui poderia sair o seguinte conselho de Descartes, “tente sempre mudar os seus desejos, não a ordem do mundo”.

Antes de avançarmos para os estudos mais recentes, é importante não esquecer que a felicidade individual pode ser frágil. Aristóteles perguntou como era possível ser feliz com infelicidade ao redor. Apenas se tivéssemos uma concepção egoísta do mundo, disse, ou, pior, disfrutássemos do sofrimento alheio. A felicidade depende, pois, não apenas de ações individuais, mas também de ações políticas.

Os estudos mais recentes sobre a felicidade.

Enquanto estudava o tema, encontrei o curso “The Science of Well-Being”, lecionado pela professora Laurie Santos, na universidade de Yale. Pareceu-me interessante pois resumia os resultados de várias investigações científicas sobre o tema, com o bónus de apresentar dicas práticas dos especialistas para aumentar os nossos níveis de felicidade, as chamadas #psychprotips.

Para aferir os resultados apresentados, a universidade de Yale utilizou a metanálise, uma metodologia que combina os resultados de múltiplos estudos científicos para encontrar uma grande conclusão, que tenha um maior poder estatístico. O curso, disponível online, através da Coursera, tem duas versões, uma para adultos e outra para adolescentes. Fiz os dois, mas a segunda, mais atual, é mais simples e dinâmica.

O conceito de felicidade utilizado baseia-se em dois pressupostos: as pessoas felizes experienciam emoções positivas com mais frequência, e sentem que a sua vida é boa. Este é mais importante, alerta a investigadora,  porque não devemos ter apenas emoções positivas. É suposto ficar-se triste com coisas tristes, com medo de coisas aterradoras, e com raiva perante as injustiças.

E como podemos sabemos se uma pessoa é feliz? Perguntando-lhe. Os cientistas que utilizam o método de “self-report” questionam os participantes sobre os seus sentimentos, crenças, e atitudes.

Aristóteles tinha ensinado que é impossível não querer perseguir a felicidade, pois a natureza fez da vida feliz o objetivo de toda a existência humana. Na verdade, mesmo que tenhamos a impressão de procurar outra coisa – amor, fama, dinheiro – esses são apenas os meios para a alcançar este bem supremo. Podemos econtrar esta ideia em estudos mais recentes. Avancemos, agora, para as conclusões das investigações contemporâneas e conheçamos o que têm em comum as pessoas mais felizes.

VIESES DA FELICIDADE

As primeira conclusão apresentada é que a nossa mente anseia por coisas que não nos fazem felizes porque sofre de vários vieses, tendo uma inclinação irracional para atribuir um julgamento mais favorável ou desfavorável a alguma coisa. Por exemplo, conseguimos prever que uma ida ao dentista não será agradável e que uma viagem ao Havai será boa. No entanto, a nossa mente não consegue prever que a ida ao dentista não será tão má como expectamos, nem a viagem ao Havai será tão boa como pensamos. Além da fraca previsão relativamente à intensidade do que vamos sentir, também sobrestimamos a duração desses sentimentos. Na prática, não nos sentiremos mal durante tanto tempo quanto esperávamos e os sentimentos bons também não durarão tanto quanto gostaríamos. O impacto dos eventos na nossa vida é sempre inferior àquele que a nossa mente prevê.

Há três grandes vieses da felicidade: a habituação, a comparação com os outros, e a limitação da nossa atenção. Para todos, temos conselhos dos especialistas para os ultrapassar.

1. Habituamo-nos às coisas, e não sabemos disso.

O primeiro grande viés da felicidade é a adaptação hedónica. Habituamo-nos de tal modo a estímulos positivos e negativos, que os efeitos emocionais desses estímulos atenuam-se à medida que o tempo passa. Se tivermos um aumento, ficamos felizes, mas duas semanas mais tarde, continua tudo igual. E o mesmo acontece com as coisas más. O nosso corpo tem um sistema imunitário psicológico, um conjunto de mecanismos inconscientes, que nos ajuda a recuperar de maus eventos. Teve mau desempenho ou má nota? Foi, certamente, porque a chefe não avaliou bem ou o professor explicou mal. Muitas vezes, não nos desafiamos suficientemente por anteciparmos que, caso falhemos, sentir-nos-emos muito mal e durante muito tempo. Mas, comprovam os estudos, não nos sentiremos assim tão mal, e perderemos muitas oportunidades.

Dicas dos especialistas para lidar com a adaptação hedónica e aumentar os níveis de felicidade:

Não podemos eliminar a adaptação hedónica, mas podemos lidar melhor com ela.

Para a contrariar, preste atenção às coisas boas que tem. Pode fazê-lo escrevendo uma pequena lista de coisas que gosta na sua vida. Ou tirar fotografias a coisas que está a apreciar num determinado momento.

Também funciona fazer visualizações negativas, uma ideia dos estoicos da Grécia Antiga. Para obtermos um incremento de felicidade, podemos visualizar uma coisa má.

Num dos estudos apresentados, os casais tiveram de escrever, durante 15 minutos, como seria a sua vida se nunca tivessem conhecido os parceiros. Ao outro grupo pediram que apenas escrevessem sobre como se conheceram. As pessoas que descreveram a experiência negativa tiveram um aumento significativo dos níveis de felicidade, em comparação com as que apenas descrevam o primeiro encontro.

Invista em experiências, não em bens materiais. Habituamo-nos a objetos, mas as experiências perduram na memória durante muito tempo, e os níveis de felicidade que obtemos com elas são superiores aos que alcançamos com bens materiais.

2. Comparámo-nos muito com os outros.

Somos muito suscetíveis a comparações sociais. Como disse Jonh Stuart Mill “Não queremos ser ricos, apenas mais ricos do que os outros”. Num dos estudos apresentados, perguntaram aos estudantes de Harvard se preferiam ganhar 50.000€ mas as outras pessoas 25.000€ ou ganhar 100.000€ e os outros 250.000€. A maioria optou por ganhar menos, mas mais do que os outros.

Além da comparação social, também temos tendência para sobrestimar a felicidade das outras pessoas. Parecem-nos sempre mais felizes do que são na realidade. E vemos muito pouco da sua infelicidade.

Estas duas características humanas, potenciadas pelas redes sociais e pela televisão, são um cocktail explosivo contra a nossa felicidade. O problema é que a nossa mente compara-se com qualquer ponto de referência, seja ele realista ou nem por isso.

Dicas dos especialistas para evitar a comparação e aumentar os níveis de felicidade:

Passe menos tempo com ecrãs para evitar comparar-se com profissionais que têm equipas responsáveis pela sua imagem, imagens editadas, e outros pontos de referência irrealistas.

Diversifique o tipo de perfis que segue e controle o que vê no feed das suas redes sociais.

 

3. A nossa atenção é limitada e direcionámo-la para coisas que não nos fazem felizes.

Quando prestamos atenção a uma coisa, colocamos um foco de luz sobre ela, e tudo o resto deixa de ser visto.

Há dois tipos de atenção: a de baixo para cima e a de cima para baixo. A atenção de baixo para cima é a que prestamos automaticamente e sem esforço a um estímulo saliente do ambiente. Por exemplo, quando toca o telefone, recebemos uma notificação, ou alguém grita “fogo”, temos uma reação fisiológica. Prestamos atenção mesmo que não queiramos. A atenção de cima para baixo é a que alocamos, conscientemente e com esforço, em algo, com base nos nossos objetivos atuais ou conhecimento anterior. Por exemplo, decidimos ler um livro ou fazer um curso para melhorarmos o nosso desempenho na escola ou no trabalho.

Ao canalizarmos a pouca atenção que temos para coias sem importância ou que não nos fazem felizes, estamos a perder as coisas boas da vida. Num dos estudos, verificou-se que as notificações diminuem a felicidade das atividades lúdicas, como jantar com os amigos ou ir ao cinema.

Dicas dos especialistas para aumentar o foco e os níveis de felicidade:

Garanta que o telefone está longe de si durante as tarefas importantes.

Melhore as definições do telemóvel, para que fique menos apelativo. Remova as notificações e coloque-o a preto e branco (Iphone – Color filters – Grayscale).

Decida, a priori, onde pretende alocar a sua atenção e tempo.

Sempre que pegar no telemóvel, pergunte-se: o que posso fazer melhor do que isto?

 

COMPORTAMENTOS QUE NOS FAZEM FELIZES

1. Conexão social

O principal comportamento que podemos adotar para sermos mais felizes é a conexão social. Um dos estudos apresentados no curso colocou a seguinte questão: “Onde é que as pessoas muito felizes passam o seu tempo livre?” A resposta foi com amigos e família. No entanto, interagir com estranhos também é considerado conexão social.

O problema agudizou-se com a digitalização, que aumentou muito a solidão. As redes sociais, por exemplo, são o meio de comunicação menos social de todos. Estamos sozinhos a olhar para um ecrã. Além disso, as aplicações são desenhadas, em geral, para que seja possível fazer coisas sem termos de interagir com pessoas. Antes da internet, comprávamos livros em livrarias, agora fazemos alguns cliques na Amazon ou noutra loja online. Os álbuns de fotografias físicos que mostrávamos presencialmente à família e aos amigos foram substituídos pelos murais das redes sociais. Quando entrávamos num táxi, falávamos com o condutor para lhe dizermos para onde queríamos ir. Com o Uber, podemos entrar e sair calados. As compras eram feitas na feira ou ao supermercado e falávamos com o talhante ou o senhor da peixaria. Agora, encomendamos online, não falamos com ninguém. Em apenas seis anos, de 2012 para 2018, o ano em que os smartphones surgiram, a solidão duplicou.

Dicas dos especialistas para aumentar a conexão social e os níveis de felicidade:

Fale com pessoas. Literalmente. Saia de casa. O simples facto de falar com alguém, mesmo que seja um estranho, fá-lo-á sentir-se muito melhor.

Mantenha as amizades que tem. Ligue ou reserve tempo para estar com os seus amigos.

Encontre formas de se envolver com pessoas que partilham os seus interesses. Faça desporto em grupo, junte-se a um clube do livro, aprenda a tocar guitarra. O que gostar, desde que envolva interação humana.

2. Amabilidade

As pessoas mais felizes voluntariam-se para ajudar e doar aos outros com mais frequência. Num dos estudos, deram 20€ a um grupo de pessoas e 5€ a outro grupo. Transmitiram a ambos que poderiam dar ou gastar o dinheiro em algo que gostassem. As que deram o dinheiro, independentemente da quantia, ficaram mais felizes, não apenas durante aquele dia, como nos dias seguintes.

Dicas dos especialistas para aproveitar o poder da amabilidade e aumentar os níveis de felicidade:

Dê tempo ou dinheiro a alguém. A quantia não é relevante.

Seja amável com as pessoas. Elogie sinceramente, deixe passar o carro parado no trânsito, etc.

3. Flow & Diversão

Flow

No livro Flow, Mihaly Csikszentmihalyi escreve que “os melhores momentos da nossa vida não são os passivos, recetivos ou relaxantes, mas os que acontecem quando o corpo e a mente são levados ao limite num esforço, voluntário, para alcançar algo difícil e que valha a pena. Neste estado, a que ele chama “Flow”, a pessoa está completamente imersa e energicamente focada numa atividade. A experiência é tão agradável que a pessoa continua a atividade mesmo com muito esforço, pelo simples facto de querer fazê-la.

Ler, subir uma montanha, tocar um instrumento musical, jogar ténis, cantar ou fazer cerâmica podem ser atividades que nos fazem alcançar o flow. O segredo é escolher uma atividade que exija concentração e algum esforço. Além disso, deve ser intrinsecamente recompensadora. Não deve ser algo que queira colocar no currículo. O resultado não deve ser importante. A ideia é divertir-se.

Mihaly argumenta que procuramos preencher o nosso vazio com recompensas externas, como a riqueza, a fama, religiões, ideologias, poder ou prazeres instantâneos, mas a felicidade, um sentimento de satisfação profundo e duradouro, é alcançado com o desenvolvimento de capacidades alinhadas com os nossos gostos e objetivos pessoais.

O desenvolvimento dessas capacidades deve ser feito de forma gradual. Não deve ser demasiado difícil ou fácil. Por exemplo, gosta de guitarras e decide aprender a tocar. Num primeiro momento, aprende os acordes mais básicos, o que já será suficientemente desafiante, ainda que perfeitamente possível. Quando já os dominar, aprende mais alguns. E assim sucessivamente. Se colocar metas demasiado altas, começará a sentir-se ansioso, o contrário de Flow, o “estado de fluxo” em que está agradavelmente concentrado e que o seu crítico interior desaparece. Não sente o tempo a passar, e até se esquece de comer ou ir à casa de banho.

Uma nota importante. Para nos podermos focar nas atividades que proporcionam “flow”, devemos diminuir ou eliminar o “junk flow” da nossa vida. A diferença entre um e outro assenta na exigência da atividade e no sentimento generalizado que temos após a atividade. Por exemplo, posso não sentir o tempo a passar a ver vídeos do Tik Tok, jogar videojogos ou ver vários episódios seguidos de uma série, mas não me fazem sentir bem a longo prazo nem me sinto energizado após as fazer.

Diversão

Quanto à diversão, outro fator importante para aumentar os níveis de felicidade, a autora Catherine Price aconselha-nos a fazer uma auditoria, e tirar algum tempo para escrever sobre os momentos mais divertidos das nossas vidas. Para isso deve:

Fazer uma lista dos três momentos da sua vida que possa descrever como “muito divertido” ou “foi tão divertido”.

Pensar em quem estava presente, o que estava a fazer, onde e quando esse momento aconteceu.

De seguida, deve tentar encontrar os fatores de diversão, o tipo ou tipos de sítios nos quais costuma divertir-se mais, as pessoas com quem habitualmente se sente mais divertido, etc.

Finalmente, deve guardar tempo para ir a esses sítios e estar com essas pessoas.

4. Forças de assinatura

Utilizar as nossas forças de assinatura ou de caráter torna-nos mais felizes. Para saber quais são as suas, faça este questionário.

Num dos estudos apresentados, os participantes deveriam utilizar uma das suas forças de assinatura todos os dias, durante uma semana. Se a força deles fosse a coragem, deveriam fazer algo corajoso todos os dias, durante uma semana. Após o estudo, viram os seus níveis de felicidade aumentar não apenas durante a semana do estudo,  como também durante os seis meses seguintes.

Para sermos mais felizes, devemos utilizar as nossas forças de assinatura no dia-a-dia, nos tempos livres e profissionalmente. Também é importante considerá-las no longo prazo, incluindo-as nas decisões sobre o percurso académico ou profissional a optar. Por exemplo, uma empregada de limpeza dos serviços oncológicos indicou que o seu trabalho não era limpar o chão após alguém vomitar, mas fazer uma piada sobre isso e fazer rir o doente. A sua força de assinatura era o humor.

Dicas dos especialistas para utilizar as suas forças de assinatura e aumentar os níveis de felicidade:

Encontre formas de utilizar as suas forças de assinatura no trabalho e nos tempos livres.

5. Hábitos saudáveis

Imagine um comprimido que aumenta o seu desempenho no trabalho, melhora a sua imagem, o torna mais feliz, é legal, gratuito e sem efeitos secundários. Quer? Esse comprimido é o exercício físico.

Num dos estudos, feito a 156 pessoas com depressão profunda, pediram aos participantes para optarem entre fazer exercício físico durante 30 minutos, três vezes por semana, durante 16 semanas (4 meses) ou tomar o antidepressivo Zoloft, durante mesmo período de tempo. 90% das pessoas que optaram pelo exercício físico recuperaram da depressão e menos de 10% recaíram. Dos que optaram por tomar o antidepressivo, 55% recuperaram e 35% tiveram uma recaída. Outros estudos relativos à depressão e à ansiedade tiveram resultados semelhantes.

Dicas dos especialistas para criar hábitos saudáveis e aumentar e os níveis de felicidade:

Para obter os efeitos deste comprimido milagroso, mexa-se 30 minutos por dia. Inclua música, amigos ou ambientes que gosta para tornar a atividade mais divertida.

Outro hábito saudável que o fará mais feliz é dormir mais, pelo menos sete horas por noite, o que não é fácil nos dias que correm. Para conseguir, deve comprar um despertador para o quarto e deixar o telemóvel noutra divisão da casa. Vai ver que dorme mais, e melhor.

6. Abundância de tempo

A abundância de tempo é o sentimento subjetivo que temos quando dispomos de tempo suficiente para lazer e outras atividades que sejam importantes para nós.

Habitualmente, enfrentamos uma dicotomia entre tempo e dinheiro. Um dos estudos verificou que as pessoas tendem a valorizar mais o dinheiro (69%) do que o tempo (31%). E as pessoas que valorizam mais o tempo, são mais felizes do que as que valorizam mais o dinheiro.

Para termos mais abundância de tempo, devemos deixar espaços em branco na agenda e fazer uma boa utilização dos confetes de tempo, os pequenos pedaços de tempo que temos entre as tarefas importantes do dia. Habitualmente, utilizamos esse tempo para fazer algo inútil, como scroll no telemóvel. Segundo a autora do termo, Brigid Schulte, devemos fazer uma lista de atividades que podemos fazer em cinco minutos, como ler qualquer coisa, beber um chá, encontrar uma nova receita para experimentar, ligar a um amigo, alongar, tratar de algo pendente, etc. A ideia é não recorrer ao telefone por defeito e sempre que temos algum tempo livre.

PENSAMENTOS QUE NOS FAZEM FELIZES

Segundo a professora Laurie Santos, de todas as conclusões de todos os estudos, a que mais a surpreendeu foi o facto de podermos mudar os nossos pensamentos. É verdade que não temos controlo sobre um pensamento inicial que surge na nossa cabeça, mas temos controlo absoluto da forma como esse pensamento se desenrola. Dá trabalho, exige muita prática, mas conseguimos fazê-lo. Por isso, para sermos mais felizes, devemos aprender a mudar os nossos pensamentos.

1.Agradecer

O primeiro passo para mudarmos os nossos padrões de pensamento é focarmo-nos nas coisas boas que já temos. Se prestarmos mais atenção às coisas boas, começaremos a ter menos pensamentos negativos. Para passar à prática, basta escrever, todos os dias, 3 ou 4 coisas pelas quais está agradecido. Pense em algo como “tenho tanta sorte em ter isto” e escreva. Um dos estudos verificou um aumento significativo de felicidade de quem executou esta prática, comparativamente a quem não o fez.

Outro estudo viu a felicidade dos participantes aumentar até seis meses após uma “visita de agradecimento”. A atividade consistiu em escrever uma carta de agradecimento a alguém que os tivesse ajudado ou sido especialmente bom com eles, e entregá-la pessoalmente. Os resultados relativamente ao aumento dos níveis de felicidade foram surpreendentes.

 

2. Prestar atenção

Os estudos concluíram que os nossos níveis de felicidade também aumentam quando nos focamos em algo ou prestamos atenção ao que estamos a fazer, mesmo que seja uma tarefa que não gostamos muito.

Acontece que, quando nos estamos a tentar focar, os nossos pensamentos fogem para outras coisas.

As boas notícias são que podemos tornar-nos muito melhores nesta tarefa se praticarmos. E o exercício ideal é a meditação. No início, pode ser muito difícil porque a nossa mente está sempre a vaguear, mas o segredo é, precisamente, voltar a prestar ao que escolheu para se focar. Cada vez que trazemos a nossa mente de volta para aquilo que escolhemos prestar atenção, é como se tivéssemos a fazer levantamento de bíceps mas na mente.

3.Lutar contra o seu crítico interior

Dizemos coisas a nós próprios que nunca diríamos a um amigo. O nosso crítico interior afirma que não valemos nada, que somos fracos, feios, gordos e más pessoas. Quando passamos por um momento difícil, diz que a culpa é nossa, chama-nos falhados, e afirma que nunca vamos conseguir nada na vida. Também acha que tem capacidades adivinhatórias e pode dizer frases como “as pessoas detestam-me” ou “ficaram achar que sou estúpido”. Ainda que saibamos que não é possível ler mentes, acreditamos no que esta narrativa interior nos diz. Em geral, também pensamos que este crítico interior nos ajuda a seremos mais exigentes connosco e, assim, a termos melhores resultados. No entanto, os estudos mostram exatamente o contrário. Quanto mais nos criticamos, pior é o nosso desempenho. Isto acontece porque o sucesso em qualquer coisa pressupõe que, às vezes, as coisas corram mal. E, se nos tratarmos mal quando falhamos, não continuaremos, nem tentaremos novamente depois. A evidência demonstra que, se recorrermos à autocompaixão, acabaremos por ser mais persistentes.

Dicas dos especialistas para aumentar a autocompaixão e os níveis de felicidade:

Só ganhamos em tratar-nos bem. Por isso, quando surgir o seu crítico interior, pense em como responderia se alguém falasse consigo nesses termos.

 

4.Ganhar perspetiva

Acontece, às vezes, termos pensamentos altamente ansiosos acerca do passado e do futuro. Frases como “a conversa com aquelas pessoas correu pessimamente”, “estive mesmo mal naquela situação” ou “nunca vou conseguir ganhar mais dinheiro” ou “vou ficar doente para sempre” ecoam intensamente na nossa cabeça.  Em geral, este tipo de pensamentos focam-se em acontecimentos sobre os quais já não temos controlo.

Dicas dos especialistas diminuir os pensamentos ansiosos e aumentar os níveis de felicidade:

Durante as espirais de pensamentos negativos, deve seguir as seguintes estratégias:

Visualizar um observador exterior sábio. Alguém que admire ou respeite muito. Por exemplo, eu poderia perguntar “o que é que o Foucault faria nesta situação?”.

Outra estratégia é falar consigo mesmo na segunda ou terceira pessoa. Em vez de “tenho de trabalhar mais”, dizer “Fabiana, tens de trabalhar mais”. Soa mais agressivo e a ideia é aumentar a distância psicológica.

5. Desenvolver a mentalidade certa

A mentalidade é constituída por aquilo em que acreditamos. E o que acreditamos não sermos capazes de fazer, afeta a nossa capacidade de fazê-lo efetivamente.

A história de Roger Bannister, a primeira pessoa a correr uma milha (1,6 Km) em menos de quatro minutos, demonstra este efeito. Até então, pensava-se que era humanamente impossível mas, após três meses de ele conseguir, várias pessoas ultrapassaram esse recorde. Apenas porque começaram a acreditar que era possível.

O método científico utilizado neste estudo, distingue dois tipos de mentalidade, a fixa e a de crescimento. Quem tem mentalidade fixa, acredita que as suas qualidades básicas, como a inteligência, o talento, a preparação física ou a amabilidade, são traços de personalidade fixos, que não conseguimos mudar. Os possuidores de mentalidade de crescimento, pelo contrário, acreditam que as suas qualidades básicas podem ser mudadas e desenvolvidas através da dedicação e trabalho árduo.

Como já seria de esperar, os resultados dos estudos mostram que a felicidade depende do tipo de mentalidade que se tem.

Dicas dos especialistas para desenvolver a mentalidade correta e aumentar os níveis de felicidade:

Sendo assim, a questão que se segue é como podemos adotar a mentalidade correta. Utilizando uma estratégia muito simples: acrescentando a palavra “ainda” para transformar uma afirmação de mentalidade fixa numa afirmação de mentalidade de crescimento. Por exemplo, substituir a expressão “não sou capaz e fazer isto” por “não sou capaz de fazer isto, ainda”.

A maioria das características humanas funcionam como um músculo, sendo possível mudá-las. Por isso, pegue num papel e numa caneta, escreva as coisas que acha não ser capaz de fazer e acrescente a palavra ainda a todas elas.

SENTIMENTOS QUE NOS FAZEM FELIZES

Além dos pensamentos e comportamentos, também há sentimentos que nos fazem felizes ou diminuem a nossa infelicidade. O primeiro é a aceitação das emoções negativas.

1.Aceitar as emoções negativas

Quando sentimos emoções das quais não gostamos, o nosso instinto é afastá-las ou escondê-las. Mas essa estratégia não só não funciona, como piora a situação.

Há duas frases emblemáticas que se aplicam à teoria do processo irónico, esta ideia que as tentativas deliberadas de suprimir pensamentos ou emoções tornam mais provável o seu ressurgimento. Uma é de Carl Jung “Aquilo a que se resiste, não só persiste, como aumenta de tamanho” e a de Dostoievski que desafia o leitor ao seguinte “Tenta impor-te esta tarefa: não pensar no urso polar, e verás que aquele pensamento amaldiçoado irá aparecer-te na mente a cada minuto”.

Os estudos científicos confirmam este fenómeno. Num deles, pediram a metade dos participantes para pensarem num urso branco, indicando o seguinte: “Tente pensar num urso branco”, e à outra metade, o contrário “Tente não pensar no urso branco”. Aos que pediram para pensar, pensaram cada vez menos, e aos que pediram para não pensar, pensaram cada vez mais.

Dicas dos especialistas para aceitar as emoções negativas e aumentar os níveis de felicidade:

Sabendo deste fenómeno, o que nos aconselham os especialistas?

Em primeiro lugar, perceber que as emoções são como as ondas, vão e vêm. Devemos simplesmente deixá-las passar. Não tente mudar os sentimentos negativos. Observe-os, sem julgar, e aguarde que passem, o que acontecerá entre 10 a 15 minutos

Outra prática de aceitação das emoções é a meditação R.A.I.N (recognition, allow, investigate, nutrition). Quando surgir uma emoção negativa a chegar, sente-se e:

1. Reconheça o que está a acontecer. Pode pegar num papel e numa caneta e responder à questão “que emoção estou a sentir?”.

2. Depois, deve deixar o sentimento ficar como está. Tolere esse sentimento durante alguns minutos, sabendo que entretanto ele se vai embora.

3. Investigue-se. De repente, deu-lhe vontade de pegar no telemóvel? Comer alguma coisa específica? Não faça nada. Apenas observe que, quando tem este tipo de emoção, costuma camuflá-la com o telemóvel, comida, ou de outra forma.

4. Por último, faça alguma coisa que gosta, de forma a nutrir-se mentalmente.

2. Preencher as lacunas de empatia.

Segundo os investigadores, existe um gap de empatia entre o nosso estado cognitivo “quente” e o estado cognitivo “frio”. Os processos de pensamentos do estado quente ocorrem frequentemente quando estramos stressados, com fome ou cansados e influenciam negativamente as nossas atitudes, preferências e comportamentos. Ao contrário do estado “frio”, em que estamos calmos e descansados, no estado quente tomamos frequentemente más decisões.

Segundo os especialistas, o segredo está em evitar entrar no estado quente ou preparar-se para quando ele vier. Por um lado, não deve deixar-se ficar com fome e não entrar em privação do sono, e, por outro, como sabe que o seu “eu quente” tomará más decisões, deve fazer ajustes no meio ambiente enquanto está no estado frio. Por exemplo, se sabe que o seu eu quente, cansado, desistirá de fazer exercício à primeira oportunidade, deixe o saco da ginástica já pronto no carro. Se sabe que, de manhã, cheio de sono, vai adiar sucessivamente o despertador, coloque-o longe da mesinha de cabeceira, para ter de levantar-se.

3. Regular o seu mecanismo de lutar ou fugir

O nosso corpo foi construído para responder a situações stressantes e a situações calmas. Quando vemos uma serpente, temos uma reação fisiológica instantânea. O coração começa a bater muito, a digestão e o intestino param, a função sexual é inativada e a respiração torna-se rápida e superficial. O nosso corpo transforma-se imediatamente, desligando todas as outras funções, para conseguir lutar ou fugir. O mesmo acontece com as ameaças sociais. Se for rejeitado ou alguém for maldoso consigo, o corpo tem a mesma reação. Este sistema de lutar ou fugir, que faz parte do sistema nervoso autónomo, causa muito stress e ansiedade ao nosso corpo. Se estivermos constantemente neste estado, desenvolvemos problemas digestivos, acne, dores de cabeça, insónia, fadiga, problemas reprodutivos, e estaremos constantemente doentes.

Dicas dos especialistas para regular o mecanismo de lutar ou fugir e aumentar os níveis de felicidade:

A boa notícia é que o nosso corpo alterna entre o estado de stress e o estado calmo, aquele em que todas as funções vitais regressam ao ativo. O corpo apenas está num ou noutro. E, segundo os especialistas, é possível utilizar um atalho para passar de um estado para o outro: respirar lenta e profundamente. Sei que pode ser irritante que nos peçam para respirar profundamente quando estamos stressados, mas funciona. O que está a fazer é enganar o seu corpo, que pensará “Se tivesse uma tigre à minha frente, não poderia estar a respirar tão lenta e profundamente. Não pode ser um tigre”. E muda para o estado calmo.

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