Nada de novo.
Ontem, ouvi na rádio alguém dizer que já foi tudo inventado e que não se cria nada de novo. Realmente, o que essas pessoas ouvem, lêem e vêm, não é novo. O critério de quem escolhe as músicas que passam na rádio, os livros da Fnac e da Amazon, e das obras dos grandes museus, não é a novidade. Estes sítios apenas mostram o que já foi mil vezes mastigado, e está mais do que confirmado. Não arriscam. É o mercado. Mas a arte floresce em muitos recantos desconhecidos.
As obras mais divulgadas são-no porque ou ganharam um prémio, ou o autor estudou numa universidade de renome, tem muitos seguidores na internet, ou vem de uma família de artistas cujo nome supostamente lhes dá acesso direto a qualidade de criação (já perdi a conta aos que andam pendurados na Sophia de Mello Breyner).
Os críticos ou escrevem sobre o que já foi comentado lá fora ou firmam-se noutras bengalas de reconhecimento. Não foi Kant que disse que apenas atingimos a maioridade quando somos capazes de pensar sem termos a necessidade de recitar um livro?
Compreendo que a falta de tempo e o medo do desconhecido os impeça de entrar nos bares com luzes duvidosas, onde começaram a tocar os melhores músicos, nas galerias que ninguém conhece, onde não há quem lhes ateste se aquilo é bom ou mau, e nas livrarias com livros que nunca foram citados. Sei que é difícil ouvir, ler ou ver obras de artistas que não passaram pelo crivo de ninguém, e arriscar falar com pessoas sem credenciais.
Sou compassiva até ao ponto de encherem a boca a falar de artistas a quem nunca teriam respondido a um e-mail. Mas agora já não são perigosos, nem loucos, nem demasiado distópicos, nem demasiado utópicos, e já não importa como escrevem, e já não querem saber se não põem vírgulas, que a música é demasiado rápida ou demasiado lenta, e que a escultura deveria ter as curvas mais ou menos acentuadas, e que, afinal, aquilo não é bem arte. Agora que já morreram e não ameaçam nada nem ninguém, são uns heróis, não é?
A verdade é que percebo. Porque a grande questão é que apenas um artista tem a capacidade de reconhecer outro. Esteja ele a tocar na rua ou num sumptuoso salão de baile, ambos sabem de onde vieram aquelas partituras, se da exterioridade, se do espaço literário. É por isso que a Joana Vasconcelos e o Paulo Gonzo podem ser pessoas interessantes e criar coisas belas (esta custou-me), mas não arte. Porque a arte nunca foi beleza, nem a clássica. Todos os artistas concordam, menos os que não são. Pode acontecer ser bela, mas foi sem querer. A arte é sempre um pedaço de ar puro.
Assumir que já nada se cria são tantas gramas de sobranceria quantas de desconhecimento. Podem falar à vontade, porque até os ignorantes devem ter liberdade de expressão, mas não me venham enfadar com esse discurso bafiento. Definitivamente, não há nada de novo, na vossa cabeça.