O prazer do texto.
Mal abro as hostes do meu e-mail, começam logo a brotar parvoíces. Como a resposta a um deles é serviço público, e de outro modo não responderia, vou colocá-la aqui. Pode ser que tenham a mesma dúvida.
“Ao que parece, não sabe muito bem a diferença entre hipersexualização e liberdade sexual. Aqui vai uma pequena ajuda:
Visto-me de forma sexy (seja lá o que isso for), apesar de sentir-me desconfortável, para me integrar socialmente e porque acho que esse é o meu valor de troca.
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Visto-me de forma sedutora (seja lá o que isso for), porque a encenação aumenta a minha potência de diversão.
O meu objetivo é agradar e dar prazer.
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O meu objetivo é partilhar e ter prazer.
Reproduzo a estética pornográfica nos meus atos sexuais porque não sei distinguir cinema de realidade.
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Vejo pornografia porque me excita, mas admito que tenho péssimo gosto e que a maioria dela reproduz estereótipos de gente néscia.
Não compreendo a diferença entre um órgão sexual e um ser humano inteiro.
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Fiz um trabalho na faculdade sobre a Jouissance do Lacan e o Corpo Sem Órgãos do Deleuze e do Guattari.
Tenho a certeza que todas as mulheres têm algo em comum.
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Admito que não me conheço, quanto mais ter a pretensão de conhecer todas “as mulheres”.
Tenho objetivos de performance sexual.
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Percebo que a cama é mais uma pista de dança do que um ginásio.
Faço intervenções plásticas para sentir-me mais desejável.
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Compro um livro sobre a semiótica do desejo.
Acho que o órgão sexual feminino é uma cavidade e nunca ouvi falar de vulvas.
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Sei o que é um clitóris e o que fazer com ele.
Tenho a Fundamentação da Metafísica dos Costumes na mesinha de cabeceira.
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Leio Bataille para me embalar antes de adormecer.
Instalei luzes fluorescentes em toda a casa para ver tudo muito bem.
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Até na cozinha tenho candeeiros com regulador de intensidade.
Chamo frígida a uma mulher que não quer fazer sexo.
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Compreendo que há muitos motivos para alguém não querer fazer sexo, sendo a falta de interesse em mim um deles.
Considero-me a Madre Teresa por dedicar muito tempo aos “preliminares”.
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Sei que é pateta chamar “preliminares” à parte da estimulação feminina porque ela JÁ é o ato sexual, não a entrada para o prato principal, que seria o meu prazer. Inclusivamente, costumo dizer “Aquela mulher é excelente! Até insiste em satisfazer-me depois de se vir!”
Sei que “Come as you are” é uma música dos Nirvana, mas considero o meu pénis ou seios demasiado pequenos.
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Li o livro homónimo da Emily Nagiski e descobri que os orgasmos acontecem no cérebro, não nos genitais.
Comporto-me como um produto sexual, um verdadeiro macho, e sigo todas as instruções das revistas masculinas.
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Divirto-me, apenas.
Sou obcecado por sexo.
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Sei que há muitas formas de ter prazer na vida, sendo o sexo uma das melhores.
Sou um burgesso.
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Sou alguém com quem vale a pena copular.